O que é Slow Food?
- Nutriversidade
- 8 de out. de 2018
- 7 min de leitura
Atualizado: 6 de nov. de 2018

Em 1986, um grupo liderado por Carlo Petrini realizou um protesto contra a abertura da primeira loja do McDonald’s na Itália. O grupo ofereceu naquela ocasião uma porção de massa aos pedestres, evidenciando o contraponto entre a cultura alimentar local e a lanchonete. A manifestação ocorreu na tradicional Piazza di Spagna, em Roma, e esse grupo se opunha política, filosófica e simbolicamente ao fast food, representado pela franquia.
A oferta de um alimento barato, muito calórico e sem valor nutricional e cultural era – e continua sendo – uma grande ameaça ao patrimônio alimentar do mundo. Três anos depois do protesto, em 1989, foi oficializado o movimento, a partir do Manifesto Slow Food. Desde o princípio, a busca pelo prazer na alimentação tem grande valor e também possibilitou, aos poucos, a compreensão mais profunda trazida na síntese do próprio lema: “alimento bom, limpo e justo”. Com o tempo, passou a olhar para toda a cadeia agroalimentar, as práticas adotadas pelos produtores assim como pelos consumidores. Foi, então, a partir dos anos 90 que ocorreu a compreensão da relevância da sociobiodiversidade alimentar para a filosofia do movimento.
Hoje, o Slow Food é uma rede global, presente em mais de 160 países, que relaciona o prazer da comida com o comprometimento e a responsabilidade com as pessoas e o planeta. Defende a sociobiodiversidade e a cultura alimentar; promove a educação alimentar e do gosto para o reconhecimento e a valorização de um alimento bom, limpo e justo para todos; encurta a cadeia de consumo, aproximando produtor e coprodutor (consumidor engajado com o todo o sistema agroalimentar). É organizada numa associação sem fins lucrativos e envolve mais de 1500 Convívios (grupos locais) e 2400 Comunidades do Alimento. A rede criada pelo movimento conta com os mais diversos atores unidos à luta
pelo alimento: agricultores, ativistas, acadêmicos, pesquisadores, pescadores artesanais, queijeiros, extrativistas, cozinheiros, jornalistas, formadores de opinião e cidadãos engajados de várias formações e classes sociais. No Brasil o movimento surgiu em 2000, com a fundação do Slow Food Rio de Janeiro, por Margarida Nogueira e atualmente está presente nas cinco macrorregiões, e conta com cerca de 60 Convívios, mais de 200 Comunidades do Alimento e 10 Grupos de Trabalho (GTs).
O Slow Food promove globalmente seus temas e campanhas para fomentar a discussão e aprofundar as diversas questões que estão ligadas ao sistema alimentar vigente. Os temas e campanhas são incentivados globalmente e realizados localmente pela rede Slow Food conforme ela se estrutura, se auto-organiza e suas partes se apropriam dos temas.
Arca do Gosto

Uma das principais iniciativas do movimento é a identificação e catalogação de alimentos que compõem a sociobiodiversidade e as tradições alimentares locais e que estão ameaçados pela padronização alimentar, agricultura industrial e degradação ambiental: é a Arca do Gosto.
Na Arca, embarcam alimentos que apresentam risco biológico de extinção, mas também produtos beneficiados e técnicas produtivas em risco de desaparecimento. Pois junto com a biodiversidade desaparece a cultura a ela atrelada, como queijos, carnes curadas, pães, embutidos e outros alimentos que são a expressão de saberes rurais e artesanais complexos, frutos de habilidades e práticas desenvolvidas e transmitidas há gerações por registros escritos ou pela oralidade.
Em outubro de 2012, em Turim, o Congresso Internacional do Slow Food, teve como destaque a biodiversidade, re-lançando o projeto da Arca do Gosto como programa fundamental do movimento, que envolve convívios, comunidades do alimento e grupos de trabalho.
A Arca do Gosto foi criada para chamar a atenção para esses produtos, denunciar o seu risco de extinção biológica ou cultural e convidar todos a agir para conservá-los: buscá-los, comprá-los, comê-los, apresentá-los, apoiar os produtores e, em alguns casos (quando os produtos são espécies silvestres muito vulneráveis), interromper seu consumo, promover sua preservação e reprodução.
O objetivo da Arca não é colecionar sementes, material genético ou ferramentas para expor os conhecimentos tradicionais, mas redescobrir e valorizar esses recursos para apoiar as economias locais.
COMUNIDADES DO ALIMENTO
A partir da comida, é possível definir um conceito de comunidade que envolve todos que se identificam com um ou mais produtos da sociobiodiversidade e cultura alimentares e, também, aqueles que colaboram na criação da economia alimentar em seu entorno. A produção, beneficiamento, distribuição e consumo da comida integram as pessoas para garantir o suporte econômico, proteção do ambiente e a saúde humana em um determinado território.
Em 2004, ocorreu a primeira edição do Terra Madre, em Turim. Nesse evento o Slow Food cunhou o termo Comunidade do Alimento para se referir aos diversos grupos tão distintos entre si mas que em comum tinham o alimento e o pertencimento em relação aos seus respectivos territórios. Naquela edição comunidades de mais de 130 países estiveram presentes. O movimento valoriza os alimentos trazidos pelas comunidades e entende que ao fazer isso, valoriza também suas comunidades produtoras. O respeito à cultura alimentar possibilita restaurar o orgulho e a dignidade daquelas pessoas que cultivam e beneficiam os alimentos (muitas vezes marginalizados e esquecidos), além de cooperar para melhoria de renda, autoconfiança e motivação. O Slow Food entende que a cooperação e o desenvolvimento baseados na comida são poderosos agentes de mudanças.
As Comunidades do Alimento envolvem todos os atores e produtos que representam a localidade: agricultores, guardiões de sementes, pescadores artesanais, coletores e extrativistas, criadores de animais, açougueiros, e coprodutores, dentre outros.
O grupo compreende os problemas gerados pela agricultura industrial que degrada os recursos naturais, pela indústria alimentar e pelo modelo de distribuição que visa a homogeneização do gosto e que atua contra a agricultura familiar e a agroecologia. A Comunidade do Alimento pode produzir alimentos artesanais segundo os princípios do ‘alimento bom, limpo e justo’, ou trabalhar na construção de um modelo de produção, distribuição e consumo mais sustentáveis.
FORTALEZAS SLOW FOOD
Com o objetivo de atuar junto às comunidades e potencializar seus trabalhos com os alimentos bons, limpos e justos, a Fundação Slow Food para a Biodiversidade (órgão técnico do Slow Food Internacional) criou, em 1999, o projeto Fortalezas. O projeto estimula a aproximação entre produtores organizados e mercados sensíveis à qualidade de seus produtos e devem seguir os critérios de sustentabilidade ambiental (limpo) e socioeconômica (justo). Comparado aos critérios adotados para as Comunidades do Alimento, mencionada acima, as Fortalezas exigem maior aprofundamento uma vez que o desenvolvimento dos produtos devem seguir um protocolo de produção definido pela Comunidade junto ao Slow Food.
Limpo
Técnicas de cultivo usadas pelos produtores da Fortaleza devem conservar a fertilidade da terra e dos recursos hídricos, evitar o uso de produtos químicos sintéticos e manter métodos tradicionais de cultivo e de gestão de terra tradicionais, sempre que possível. Os métodos e os locais de produção devem conservar a paisagem e preservar a arquitetura tradicional. Monocultivos intensivos (mesmo que aplicados a variedades tradicionais ou ecótipos) não respeitam esse aspecto, e é um fator inviabilizador para a formação de uma Fortaleza, assim como produção pecuária intensiva, técnicas de pesca depredatórias, produtos ultraprocessados ou geneticamente modificados.
Justo
Uma Fortaleza sempre envolve uma Comunidade do Alimento. Não é um projeto em favor de um produtor individual ou isolado. Os produtores devem ter um papel ativo e ser capazes de influenciar as decisões da comunidade. Por esta razão, as figuras centrais dos projetos são os próprios produtores. As pessoas com quem precisamos trabalhar para desenvolver uma Fortaleza não devem estar sujeitas a decisões de proprietários de terras ou de grandes empresas. Portanto, uma Fortaleza não pode ser criada com produtores sem completa autonomia na gestão de suas atividades.
Os produtores devem estar dispostos a colaborar e a elaborar juntos um protocolo de produção comum e os métodos de promoção do produto, possivelmente se reunindo em organizações (associações, consórcios e cooperativas). Um dos objetivos da Fortaleza é obter um preço adequado para a Comunidade, melhorar sua qualidade de vida e a situação socioeconômica de suas famílias. O preço também deve ser transparente e justo para os consumidores.
Os alimentos produzidos por agricultores familiares ou por comunidades tradicionais das Fortalezas originam-se, com frequência, em regiões marginais (montanhas altas, ilhas, áreas rurais isoladas) e em condições desafiadoras. Muitas vezes, exigem mais cuidado, habilidade manual, períodos de processamento, maturação mais longa e só podem ser produzidos em pequenas quantidades. Com frequência, o mercado não reconhece o valor real dos produtos artesanais e condena-os a seguir as leis do mercado padronizado, onde competem com produtos de qualidade inferior.
Não é fácil estabelecer o que é um preço “justo” para o produtor (e para o consumidor!). Os produtores devem fazer um esforço para quantificar o tempo de processamento e seus custos de produção, que incluem energia, matéria-prima, logística, etc., e estabelecer um preço que compense. Os consumidores devem fazer um esforço para avaliar a Fortaleza sem automaticamente fazer comparações com os preços de produtos semelhantes, mas com outra origem, ou produzidos em escala industrial.
O que achou do movimento Slow Food? Este texto foi retirado de uma publicação do próprio movimento e você pode ler todo o documento clicando aqui. Se quiser conhecer mais sobre o movimento Slow Food, seus projetos e seus apoiadores dentro da própria UFSC, basta clicar aqui.

Renê Birochi
Doutor em Administração pela FGV, atua como pesquisador do grupo de pesquisa em Agroecologia e Circuitos de Comercialização de Alimentos da UFSC. Entusiasta de alimentos bons, limpos e justos e do movimento Slow Food.
Nos dias 12 e 13 de novembro teremos o evento Nutriversidade, que será no auditório da reitoria da UFSC. Veja a programação completa, empresas apoiadoras e se inscreva aqui: https://www.sympla.com.br/nutriversidade__379547
Ao se inscreverem vocês estão concorrendo a um voucher de R$150,00 no Feirão dos Calçados. Teremos palestras com nutricionista, psicóloga, engenheiro de alimentos e muito mais. Diversas empresas estarão presentes nos apoiando, dentre elas o Sesc com demonstração durante todo o evento de receitas deliciosas, academia Curves e academia Just Gym vão sortear 1 mês de academia cada, Fábrica de suplementos vai dar diversas coqueteleiras e pastas de amendoim para degustação, Emporio Doll, Café La Bohème, Natú, Víveres (biscoitos veganos), dentre diversas outras empresas.
O ingresso é 1 quilo de alimento não perecível que doaremos para o Projeto Resgate, que faz refeições para moradores de rua. O evento é aberto para toda comunidade e entregaremos certificado de horas de pesquisa e extensão aos acadêmicos. Esperamos por vocês. ❤
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